José Fernandes Pereira, um nome de gente simples, nome de trabalhador, nome de brasileiro e este é o nosso personagem de hoje. O José Fernandes Pereira é, de fato, simples, trabalhador e brasileiro, além de ser o Dr. Fernandes, delegado titular da Polícia Civil de Limoeiro do Norte, situada a 204 km da capital alencarina, Fortaleza.
O delegado Fernandes possui 31 anos de serviços prestados a manter a ordem e a segurança em várias cidades. Entre idas e vindas, já são oito anos como titular a frente da delegacia da “Princesinha do Vale” e, exclusivo para o nosso blog, Dr. Fernandes nos explica como está a atual conjuntura da segurança pública em Limoeiro do Norte, ninguém melhor que ele para esclarecer todas as questões.
COMO SE ENCONTRA, NOS DIAS DE HOJE, A SEGURANÇA PÚBLICA DA CIDADE DE LIMOEIRO DO NORTE?
A segurança na cidade é um pouco precária, muito pela a falta de condições que as polícias, de um modo geral, se encontram, mas isso não é um privilégio somente de Limoeiro do Norte não, essa é a situação de muitas delegacias do nosso estado. A falta de contingente também é um problema que nos tira o sono, para você ter uma idéia, agora aqui nós contamos apenas com o “permanente” [policial responsável em atender as pessoas que chegam à delegacia] e eu, se por acaso houver um acidente em algum ponto da cidade e para nos deslocarmos até lá, será preciso fechar a delegacia, o que não poderia acontecer. Quando o permanente tem de se ausentar por algum motivo, eu, o delegado, é que faço a função dele, a gente tem de se virar.
O permanente estava na delegacia, de prontidão, por isso o Dr. Fernandes pôde nos conceder a entrevista... Ainda bem!
O CIDADÃO LIMOEIRENSE SE SENTE PROTEGIDO AO SAIR ÀS RUAS?
Nós sabemos que o bandido está em qualquer esquina e de qualquer cidade, até nós, da própria polícia, sentimos medo de sair às ruas, porque ninguém está completamente seguro, ninguém está totalmente imune à ação dos ladrões, mas nós tentamos fazer o melhor possível para que o cidadão possa ir tranqüilo ao centro da cidade fazer suas compras, possa ir ao bar da esquina tomar a sua cerveja em paz, possa colocar a cadeira na calçada sem ser incomodado.
A polícia faz o possível para que isso aconteça, mas é claro que crimes continuarão acontecendo como em qualquer parte, os roubos, as mortes, isso é inevitável, o que podemos fazer tentar minimizar esses problemas.
É costume na cidade de Limoeiro do Norte as pessoas irem à feira principalmente nos dias de sábado, no centro da cidade. Também é costume sentar-se à calçada para jogar conversa fora com vizinhos e familiares... Esse costume ainda, eu disse ainda, existe!
LIMOEIRO, AO LONGO DE SUA HISTÓRIA, SEMPRE FOI CONHECIDA POR SUA CALMARIA E HOSPITALIDADE, MAS COM OS ASSASSINATOS DO RENOMADO RADIALISTA NICANOR LINHARES E DO, NA ÉPOCA VEREADOR, LINCOLN MAIA, COM A CHACINA ONDE 7 PESSOAS FORAM ASSASSINADAS E COM O APARECIMENTO DO TEMIDO CHICO ORELHA, ATRIBUIU-SE À LIMOEIRO A MÁ FAMA DE CIDADE PERIGOSA. ESSE RÓTULO ATRAPALHA A AÇÃO DA POLÍCIA?
Atrapalhou e muito o nosso trabalho, como eu já disse anteriormente, até o policial, que é, antes de qualquer coisa, um homem comum, se sentia ameaçado, amedrontado nesse período, mas nós lutamos para que isso mudasse.
Esses acontecimentos trágicos foram exceções na história de Limoeiro do Norte, a cidade sempre respirou ares de tranqüilidade, mas passou por essa época negra, foram meses de tensão, mas isso tudo passou, seria injusto rotular a cidade como perigosa por conta de apenas um curto, mas tenebroso período em uma bela história centenária como é a de Limoeiro. Aos poucos, essa imagem de Limoeiro como terra de assassinatos, chacinas, matadores de aluguel e crimes de “pistolagem” vai mudando, lutamos contra isso.
O radialista Nicanor Linhares Batista foi brutalmente assassinado nos estúdios de sua rádio enquanto gravava um programa, há seis anos, o crime ganhou repercussão internacional e até hoje não foi elucidado. Já Lincoln Andrade Maia foi executado, a sangue frio, na porta de sua casa, até hoje, como o caso do radialista, o crime não foi desvendado.
A “chacina do mata-sete” aconteceu no bairro Luiz Alves de Freitas (Roçado), onde sete pessoas tiveram suas vidas ceifadas, o motivo até hoje é um mistério e, nesse período, surgiu o assassino Chico Orelha, autor de várias atrocidades pela região, Orelha foi morto em um cativeiro nas proximidades de Baraúna, interior potiguar.
QUAL É A ATUAL SITUAÇÃO DAS POLÍCIAS MILITAR E CIVIL EM LIMOEIRO?
Precária. Muito precária. A polícia, tanto Civil como a Militar, sofre com a falta de recursos e de condições para que possamos realizar um trabalho mais eficaz e isso reflete na população, já que o cidadão não vendo o policial nas ruas vai ter a sensação de insegurança aumentada.
Nossos equipamentos estão velhos e defasados, as viaturas estão completamente sucateadas, sem a mínima condição de uso nas rondas pela cidade ou, no caso se precisar, em uma perseguição policial, por exemplo. A Policia Militar está com três viaturas paradas por falta de condições de uso, estão quebradas e nós, da Polícia Civil, possuímos apenas uma única viatura, que já está precisando ser “aposentada”. Nossos armamentos já estão ultrapassados, enquanto os bandidos utilizam armas e munições de última geração. Sem falar na falta de contingente necessário para se estabelecer a ordem na cidade, hoje nós contamos apenas com quatro permanentes, um único inspetor e quatro escrivãs, sendo duas delas terceirizadas, ou seja, falta gente para trabalhar, concursos são realizados, mas os profissionais não chegam aqui. Algo tem de ser feito.
O tempo de vida útil de uma viatura policial gira em torno de dois anos. As viaturas utilizadas pela polícia de Limoeiro já ultrapassam os oito anos de uso, algumas ainda, mais uma vez ainda, funcionam, outras não. A manutenção dessas viaturas é feita gratuitamente por oficinas mecânicas da cidade, como a Auto-Maia, do mecânico Miguel Maia, Oficina Garcia, do Doca e o mecânico Dedé de Terezinha, além de peças que são ofertadas por comerciantes também de Limoeiro do Norte.
QUAL A SITUAÇÃO DA DELEGACIA DE LIMOEIRO DO NORTE?
Estou sendo até repetitivo, mas a situação é precária. Já falei com as autoridades maiores, já conversei inúmeras vezes com o Prefeito João Dilmar da Silva, pedi que ele olhasse para nós com bons olhos, pedi que construísse uma delegacia à altura da cidade de Limoeiro do Norte, que é uma cidade desenvolvida, talvez a mais desenvolvida da região, possui faculdades, uma delas é federal agora, é a sede do bispado, tem a única Igreja Matriz da região, a cidade possui sedes da Procuradoria da Justiça Federal, da própria Justiça Federal e do Trabalho e não possui uma delegacia de qualidade. O Prefeito me prometeu que iria construir uma delegacia, mas até hoje não passou de promessa.
A situação nossa aqui é bastante preocupante, isso aqui é quase um improviso, pois esse prédio fazia parte do presídio da cidade, eles nos cederam esse espaço, mas não é o que precisamos, as coisas ficam amontoadas pelos cantos, meu gabinete serve como depósito também, uma verdadeira bagunça. Você está me vendo aqui, em pleno domingo, horário de almoço, eu deveria estar em casa com a minha família, mas não, eu estou aqui, adiantando alguns relatórios, atendendo quando domingo não é dia de atendimento, estou aqui porque gosto, amo meu trabalho, me dedico ao máximo para atender as necessidades da população, lhe proponho até um desafio: entrar em contato com as delegacias todas da região para saber se há algum delegado trabalhando no domingo, se houver algum eu lhe entrego meu ordenado, que não é muito, mas é o meu ordenado. Mas um dia eu me cansarei de lutar para melhorar a polícia da cidade, vai chegar a hora da minha aposentadoria, que não está tão longe assim, irei com a minha consciência tranquila para casa e outro irá ocupar o meu lugar aqui nesse gabinete, nessa cadeira e caberá a ele, ou não, lutar pelas mesmas coisas que lutei, por uma polícia melhor.
Eu aceitei o desafio, entrei em contato com as delegacias de Morada Nova e Tabuleiro do Norte, mas fui informado de que não havia delegado aos domingos lá e nem de segunda a sábado, nessas cidades, há mais de um ano não há delegado em dia nenhum... De qualquer forma, não ganhei o ordenado do Dr. Fernandes, uma pena!
Mas o nosso determinado delegado mantém esse costume de ir aos domingos à delegacia, para agilizar seu trabalho.
O QUE PODERIA SER FEITO PARA QUE LIMOEIRO SE TORNASSE UMA CIDADE MAIS SEGURA?
É difícil dizer assim, Limoeiro não é uma cidade violenta, quem mora aqui sabe disso, as ocorrências são normais. O que poderia ser feito para dar ainda mais tranqüilidade aos cidadãos é municiar as policias, dar as devidas condições à quem é responsável pela proteção de toda uma cidade, nós, policiais, nos sentimos desprezados pelo Poder, sentimos o descaso que é trabalhar na polícia, ainda somos acusados de muitas coisas pelo qual não temos culpa.
Nós necessitamos de muito mais homens na polícia, gente capacitada, competente, gente preparada para enfrentar o dia-a-dia de uma delegacia cheia de ocorrências, com condições de manejar armas sofisticadas, até porque não adianta jogar uma arma moderna na mão de um policial que não sabe usá-la, é um desperdício. É preciso que esses homens recebam uma preparação adequada, um salário digno para quem arrisca a vida todos os dias para proteger os civis, viaturas e motos capazes de dar a mobilidade que a polícia, de um modo geral, precisa para realizar seu trabalho com eficácia, uma delegacia equipada, com toda a aparelhagem, e uma das coisas primordiais para a segurança da população: a ajuda da própria população.
Fica muito mais difícil efetuar prisões, prosseguir com investigações e elucidar casos quando os próprios civis não contribuem. É comum acontecerem roubos, furtos, crimes em geral e cidadãos presenciarem o ocorrido, até dizem para vizinhos ou familiares que viram o que aconteceu, mas quando os convido a se fazerem presentes na delegacia para tentar ajudar no caso, eles simplesmente dizem que não viram, não sabem nada e que nem conhecem os malfeitores, sendo que mentem e não ajudam. Isso dificulta nosso trabalho, as pessoas têm medo de falar o que sabem, mesmo com a garantia de que sua identidade será mantida no mais absoluto sigilo, elas nem precisam se identificar, basta nos dar uma pista, mas preferem ocultarem os fatos. Se a população resolvesse ajudar, a cidade seria bem mais segura, pode acreditar.
Existe um programa de segurança e proteção às vítimas e testemunhas de processos judiciais, outra coisa são pessoas que fornecem informações à polícia, sua identidade nem precisa ser revelada, basta ligar e dar alguma pista, sem identificação.
O QUE O CIDADÃO LIMOEIRENSE PODE ESPERAR DA SEGURANÇA PÚBLICA PARA O FUTURO DA CIDADE?
Não estou aqui para enganar ninguém, a segurança me preocupa muito, tira o meu sono, quero fazer o melhor possível, o que o cidadão pode esperar da polícia, tanto Militar como Civil, é muito empenho, dedicação ao nosso trabalho, vontade e determinação, mas tudo isso dentro da nossa realidade. Eu sonho com uma polícia equipada e preparada para enfrentar as ocorrências, mas cada vez fica mais difícil fazer um bom trabalho, não temos expectativa de mudanças, pelo menos a curto e médio prazo, como já falei, há certo descaso para conosco.
Mas Limoeiro é uma cidade boa de se trabalhar, por isso saí e voltei, trabalhei um tempo em Tabuleiro do Norte, mas acabei voltando para cá, porque gosto daqui, Limoeiro tem um povo bom, hospitaleiro, que desenvolve a cidade, o que não acontece, não só aqui mas em todo canto, é a falta de condições que a polícia tem para trabalhar, mas quem sabe isso muda, não é?
Agradecemos ao delegado Dr. Fernandes por nos conceder essa entrevista, em um domingo de sol, em horário de almoço, dia que seria de folga.
O secretário da Segurança Pública e Defesa Social, Roberto das Chagas Monteiro, 60 anos, natural de Recife (PE), foi delegado federal por 26 anos. Exerceu o cargo de adido da embaixada brasileira na Argentina, foi chefe da Interpol junto à Polícia Federal, no Paraná, e, por último, corregedor da Agência Nacional do Petróleo (ANP). fala, lê e escreve nos seguintes idiomas: Alemão, Espanhol, Francês, Inglês, Italiano e Sueco, além de português, é claro, disciplina que já lecionou.
